A
presente recensão crítica incide no artigo “A Geografia Como Um Estudo Social –
O Seu Significado Para a Competência Cívica” de Stephen J. Thornton. Este
artigo, encontra-se no segundo capítulo do livro “Educação Para a Cidadania
Espacial – Cidadania através da Geografia” editado por Euikyung E. Shin e Sarah
Witham Bednarz no ano de 2019.
O
autor do artigo acima referido, Stephen J. Thornton, nasceu na Austrália onde fez
a sua pós-graduação em História na Universidade de Newcastle. Atualmente é professor
de Educação em Estudos Sociais na Universidade de Tampa, no Sul da Florida. O
autor publicou mais de 100 artigos e livros académicos, nos quais se inclui o “Teaching
Social Studies That Matters” que recebeu o Prémio de Escolha da Associação
Americana de Bibliotecas. A sua escrita e
pesquisa atuais, centram-se na integração curricular da Geografia e da História
em programas de Estudos Sociais.
Síntese Crítica: A Geografia nas Ciências Sociais
Este artigo recai sobre a Geografia, nos Estados Unidos da América
(EUA)
e em algumas nações mundiais, a qual se tem “combinado com outras Ciências
Sociais formando um currículo de Estudos Sociais”. Uma Justificação muito forte
para este currículo, são que coletivamente estas ciências “possam contribuir
para desenvolver a Competência Cívica nas crianças e adolescentes”.
O artigo tem como primeiro tópico: A Ideia de Ligar a Geografia à
Educação para a Cidadania. O autor, neste tópico, destaca que esta ligação
surge como construção da identidade nacional dos EUA após a Revolução Americana,
através da “escrita geográfica que já estava a ser conscientemente utilizada
para construir a identidade nacional” (Livingstone, 2005).
Outra ideia importante que o autor nos transmite, é o facto da Geografia Física,
bastante enfatizada no Séc.XIX, estar ligada a questões de cidadania e
identidade nacional, como por exemplo, “a geografia escolar encorajava o
orgulho dos estudantes nas paisagens americanas” (Elson, 1964, p.37; Schulten,
2001). Esta Geografia, também validava hierarquias raciais legitimando na época
“os americanos europeus como merecedores de uma cidadania política plena”. Em
1900, a tendência era “ligar a Geografia Física à vida das pessoas” (Bednarz
& Bednarz, 1992; Barton,2009), o que levou a uma aceitação crescente da
Geografia no currículo americano, fazendo assim uma mudança de paradigma e
“passou de um estudo principalmente de Ciências Naturais para um principalmente
de Ciências Sociais”. Juntamente com a História e os cidadãos, a Geografia foi
considerada como uma “pedra angular do novo campo abrangente dos estudos
sociais”.
Ainda neste tópico do artigo, Stephen J. Thornton mostra a acomodação e
passividade dos geógrafos e professores de Geografia, destacando que estes nas
primeiras décadas do Séc.XX “não entraram na luta curricular com a mesma
energia e entusiasmo demonstrado pelos preponentes da História e do Civismo dos
EUA” e “a passividade dos geógrafos pode ajudar a explicar porque é que um
discurso particularmente robusto sobre a forma de como a Geografia servia os
objetivos de Cidadania dos Estudos Sociais não conseguiu emergir, ou pelo
menos, falhou em relação à História e à Cidadania”. O autor refere também que
tais “circunstâncias deixaram efetivamente a Geografia de parte dos Estudos
Sociais”. Os Geógrafos e professores de Geografia “deixaram muitas vezes o
destino curricular da Geografia nas mãos de educadores de Estudos Sociais” e o autor
refere ainda que “frequentemente a Geografia escolar tem uma fraca ligação aos
objetos de Cidadania, mesmo quando as políticas curriculares exigiam uma
ligação substancial”.
Outro tópico presente neste artigo, intitula-se como A Geografia Ensinada
para a Cidadania, no qual o autor ressalva que esta “sugere a seleção de tópicos
apropriados para o estudo e a adequação é aferida pela relevância para as
exigências da vida em sociedade.” Stephen J. Thornton refere que para a
Geografia Ensinada para a Cidadania, existe a investigação Geográfica ativa
como a solução através de métodos práticos, por exemplo, os alunos irem visitar
um armazém local de distribuição alimentar para que as crianças possam assim
“desenvolver os hábitos de observação e experimentação em primeira mão e o
pensamento de relacionamento que as acompanhava” e salienta também que as
relações geográficas são a “chave para compreender o mundo em geral e não
apenas a área local”. (Mitchell 1991) Neste tópico, o autor afirma ainda que a “cooperação
na resolução de conflitos era em si mesma um objetivo importante e relevante
para a vida em sociedade”.
Outro aspeto relevante que o autor mostrou, no tópico da Geografia em
Cursos de História nos EUA, quando se refere a que “não é preciso muita
imaginação pedagógica para ver o potencial da integração da Geografia mesmo
dentro de um manual de história” (Nevins, 1965) e ainda que a forma, para ele,
da Geografia poder acrescentar conteúdo significativo à vida em sociedade seria
com o trabalho cartográfico em que “se estendesse a tarefas que envolvessem
pensar com mapas, de formas relevantes, não se limitando a apontar
características geográficas individuais nem assumir formas de exercícios com
competências desconexas”, por exemplo, através da comparação e contraste da
precipitação média anual, onde foram construídos caminhos de ferro, etc…
Destaca-se ainda que para o autor “muitas questões parecem ser em simultâneo
históricas e geográficas, apesar da prontidão geográfica como o lugar, espaço,
distância, entre outras”.
Pode-se ver também no artigo, mas desta feita no tópico Um Passo Necessário
na Formação de Professores, que o autor indica a má preparação dos professores
de Geografia e os poucos movimentos para a união de disciplinas e pedagogia.
Isto é salientado, quando o autor diz que “por muito louvável que seja a
Geografia Pedagógica para a Cidadania, poucos professores recebem o tipo de
preparação que apoiaria uma tal abordagem pedagógica” em que “poucos casos de
estudo em ensino de Geografia para a Cidadania estão disponíveis” para melhorar
essa formação.
Os programas de formação dos professores acabam por “separar nos cursos a
matéria disciplinar da pedagogia” e os futuros professores de Estudos Sociais que
frequentam uma série de cursos de Ciências Sociais são confrontados com
“conteúdos que raramente estão relacionados de forma sistematizada com o
currículo escolar” tornando-se num grande obstáculo para que os professores “não
estejam realmente preparados para ensinar o tipo de currículo que tem vindo a
ser abordado” e que segundo Noddings (2006) “o currículo escolar é a matéria
fundamental dos professores”. A falta de articulação, continua com os cursos de
metodologias de ensino que tem como razão de ser o “demonstrar como organizar
as disciplinas para uma utilização eficaz nas salas de aula do básico e
secundário”.
O autor, refere-se ainda à solução de simplesmente acrescentar mais disciplinas
nos cursos como “não parecer produzir por si só de forma fiável o tipo de
professores reflexivos que contribuiriam para objetos de cidadania” (Barton
& Levstik,2003). O autor tem também em crer que parece haver boas razões
para pensar que os “professores não ensinarão conteúdos de uma forma em que os
próprios nunca se depararam com bons resultados”. Stephen J. Thornton, salienta
também que apesar de poucos, “os movimentos no sentido de uma união de
disciplinas e de pedagogia parecem ser passos na direção correta”, sendo exemplos o microensino e trabalho de
campo.
Considerações Finais
Depois de analisado o texto e no que coincidiam os seus pontos chave, posso
afirmar que este artigo é bastante proveitoso na minha formação enquanto
professor de Geografia e na vertente das Ciências Socias.
Considero que Geógrafos e os educadores/professores de Geografia, têm
culpa na falta de expressão da Geografia no currículo de Estudos Sociais, isto,
a meu ver, porque sempre foram bastante condescendentes e deixaram em mãos
alheias o destino da disciplina. Estes que são responsáveis por representar a
Geografia, devem, penso eu, lutar para demonstrar as extraordinárias competências
e ferramentas que a disciplina dá aos alunos para saberem compreender melhor o
mundo que os rodeia e como responder a qualquer tipo de desafios enquanto
cidadãos. Um caso bastante específico e bem-sucedido nesta luta, ocorreu no
nosso país quando foi entregue uma petição pública, lançada por um professor de
Geografia, na Assembleia da República (AR) em 2011 para que a História e a
Geografia não se fundissem num só mestrado e daí resultasse o decreto-lei
nº79/2014 com a criação do ciclo de estudos do Mestrado em Ensino de
Geografia. Para mim, isto é um grande exemplo de como valorizar a disciplina de
Geografia no currículo das Ciências Sociais e na própria sociedade.
Esta questão, vai também ao encontro de outra temática aqui abordada, que
eu acho que o autor salientou bastante bem, sendo ela o facto dos professores
terem uma má formação e que devia ser mais articulada. No decreto-lei acima referido,
para além da criação do mestrado, tem também como intuito uma melhor e mais
rigorosa preparação dos professores. Esta formação mais articulada aos futuros
professores, penso ser um instrumento para os mesmo estarem melhor preparados
tanto a ensinar a disciplina como a instruir os alunos para uma melhor
competência cívica neste tipo de currículo.
Outro assunto, a meu ver, que o autor foca bem no artigo é a questão de a
Geografia poder ser ensinada para a competência Cívica através de métodos
práticos em que se desenvolvem “hábitos de observação e experimentação em
primeira mão e o pensamento de relacionamento”. Quero, nesta questão, realçar
ainda que segundo Mitchell (1991) “as crianças em idade escolar viverem num
mundo de produtos finais… retirados das forças que determinam o funcionamento
do ambiente que habitam” e resumida a sua abordagem às relações geográficas em
que “(…) ver, compreender e interpretar as relações neste caso (Geografia)
entre forças terrestres, grupos sociais, tradições culturais e hábitos de
trabalho. Os estudantes poderiam descobrir esta inter-relação se pensassem
científica e experimentalmente, em vez de vicariamente”. (Antler, 1987) Para
mim, as crianças devem sair da sala de aula e experienciar a realidade e isso é
uma forma de comprovar que os alunos, para além de um maior estímulo, também
conseguem compreender muito melhor a realidade das coisas que os rodeiam,
tornando-se assim em cidadãos mais conscientes, através da observação e do
contacto direto com situações reais.
Com tudo o que já foi aqui enumerado, posso concluir ainda que a Geografia,
incluída nas Ciências Sociais, aliada a uma boa formação de
educadores/professores da área, pode e deve, a meu ver, contribuir para
desenvolver a competência cívica dos alunos, tornando-os mais conscientes e
responsáveis no mundo em que vivem. Segundo Schoumaker (1985), “A Geografia deve
ajudar não somente o adolescente a ter um olhar sobre o mundo, mas deve
constituir um verdadeiro utensílio de formação” e “deve ainda levar a "saber
pensar o espaço", de forma a que compreendam e interajam no mesmo e com
isto, ajudar a sentirem-se bem no espaço que ocupam e em que vivem”. Esta
é uma posição com a qual corroboro e que ajuda a sintetizar e a perceber melhor
o papel da Geografia enquanto Estudo Social na construção da competência cívica
dos alunos e fazer com que estes se tornem melhores cidadãos no seu quotidiano.
Bibliografia
Decreto-Lei n.º 79/2014 de 14 de Maio. Diário da República n.º 92/2014, I Série. Ministério da Educação e Ciência. Lisboa.
Huckaby, M. (2020). Paradoxes & Praxis: Stephen J. Thornton. PARADOXES & PRAXIS: THE 21ST CENTURY IMPERATIVE FOR EDUCATIONAL FOUNDATIONS. Acedido a 21 de Novembro de 2020. Disponível em: https://scalar.usc.edu/works/paradoxpraxis/stephen-j-thornton.
Schoumaker, B. (1985) Savoir Penser L´espace – Pour Un Renouveau conceptuel et méthodologique de l´enseignement de la géographie dans le secondaire. L´Information Géographique. 49: 151-160.
Shin, E., Bednarz, S. (2019) Educação Para a Cidadania Espacial - Cidadania através da Geografia. 1ª Edição, Routledge. Nova Iorque.

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